Nós por nós

JORNADA DE SAÚDE NA CHAPADA: Mapeamento Busca expor desafios do acesso a saúde da população quilombola na Chapada Diamantina (BA)

Diabetes, hipertensão, doenças renais, obesidade e problemas mentais são mais comuns entre pessoas negras, segundo o Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa-Brasil), que os compara com a população branca. Essas condições geralmente não ocorrem de forma isolada; pessoas negras enfrentam, com mais frequência, a multimorbidade, ou seja, várias doenças crônicas ao mesmo tempo. Mulheres negras são as que mais adoecem, enquanto homens negros têm as maiores taxas de mortalidade.

Esse cenário de saúde já alarmante torna-se ainda mais complexo para a população quilombola, que enfrenta ainda mais dificuldades por conta da falta de dados precisos que possam orientar políticas de saúde específicas e eficazes. Para suprir essa lacuna, o Odara – Instituto da Mulher Negra, por meio de seu Programa de Saúde e do “Nós por Nós – Observatório de Justiça Reprodutiva do Nordeste”, está conduzindo o “Mapeamento do Perfil e Acesso à Saúde e Direitos Sexuais e Reprodutivos de Meninas e Mulheres Negras Quilombolas”, no território da Chapada Diamantina (BA). O estudo destina-se a romper a invisibilidade em torno das condições de acesso à saúde e aos direitos sexuais e reprodutivos que acomete as mulheres negras moradoras da zona rural, e de forma mais cruel, as mulheres negras quilombolas.

Para dar início à pesquisa, ativistas do Instituto Odara e pesquisadoras do mapeamento, estiveram, entre os dias 24 e 26 de outubro, com as comunidades quilombolas dos municípios de Boninal (BA) e Seabra (BA),  para dialogar sobre os objetivos da pesquisa e escutar as necessidades da comunidades. 

Verônica Santos, coordenadora do Observatório Nós por Nós, destaca que a pesquisa é essencial para dar visibilidade às injustiças de saúde enfrentadas pela população quilombola. “É um movimento de denúncia, para dar visibilidade às injustiças de saúde que sabemos que existem, mas que, devido ao racismo institucional no Sistema de Saúde, não temos dados robustos que nos permitam falar especificamente sobre a saúde da população quilombola, mesmo com a existência de uma Política Nacional da População Negra”, afirma.

Entre os principais resultados esperados, está o mapeamento atualizado do perfil de saúde e acesso a serviços para a população quilombola, um levantamento inédito, nesta dimensão, para a Bahia e o Nordeste. A relevância dessa pesquisa, segundo Verônica, está na criação de “dados estruturados”, que permitirão a denúncia das desigualdades de saúde enfrentadas pela população quilombola em múltiplos níveis – municipal, estadual, regional, nacional e até internacional. “Esses dados fornecerão uma base sólida para quantificar, por exemplo, o número de mulheres que sofrem violência obstétrica, que não têm acesso ao pré-natal, o número de crianças sem acesso a serviços pediátricos, o aumento dos casos de hipertensão e diabetes”, destaca Verônica.


PROTAGONISMO COMUNITÁRIO 

Durante a Jornada de Saúde na Chapada, nove comunidades foram visitadas. Em Boninal, os encontros ocorreram nas comunidades de Mulungu, Olhos d’Águinha, Bateia e Cutia. Em Seabra, as comunidades visitadas incluíram Basílio, Cachoeira e Mucambo, Baixão Velho, Serra do Queimadão e Agreste. Participaram dos encontros mulheres, homens, jovens, adolescentes e crianças, fortalecendo o diálogo coletivo. Posteriormenete serão realizadas jorndas em outras comunidades.

A agenda de atividades contou também com rodas de conversas, sambas, lanches coletivos, e também com um encontro com as meninas e adolescentes do projeto Ayomide Odara, do Instituto Odara, que debateram sobre questões relacionadas à justiça reprodutiva, abordando questões essenciais de saúde e direitos para as comunidades.

Beatriz Sousa, estudante e ativista do Núcleo de Juventudes do Odara, participou da jornada e destacou a importância de reencontrar os territórios quilombolas e pensar em novas estratégias para a atuação dos movimentos sociais para o fortalecimento dessas comunidades.

“Quando a gente pensa em saúde, a gente está pensando que é um atravessador e um marcador social muito grande. Porque quem é que pode acessar a saúde? Quem pode acessar um SUS de qualidade? Então trazer essas reflexões e ouvir essas comunidades foi bom para ter essa dimensão do compromisso dos movimentos sociais com as comunidades quilombolas, que foi de onde todos nós, enquanto população negra, saímos. Nossas histórias estão enterradas ali”, apontou a Beatriz. 

Cleonice Santos, presidente da associação de moradores da Comunidade Cachoeira e Mucambo, ressaltou a importância de abordar temas como saúde mental, alcoolismo, doenças sexualmente transmissíveis e diabetes, desafios enfrentados pela comunidade. “Nós precisamos muito de um projeto como esse na comunidade. É uma comunidade que tem muitos jovens, muitos adolescentes, e que quer mais saúde e informação para lidar com essas questões,” declarou.

Edvânia de Araújo, quilombola da comunidade de Cutia, reforçou o valor dos encontros para a discussão coletiva e individual dos desafios de saúde. “A gente pode discutir coletivamente as questões de saúde e, no individual, porque os grupos contribuíram muito para esse momento e para que as ideias fossem surgindo, assim como as demandas da comunidade,” explicou.

Os resultados do “Mapeamento do Perfil e Acesso à Saúde e Direitos Sexuais e Reprodutivos de Meninas e Mulheres Negras Quilombolas”, no território da Chapada Diamantina (BA) tem previsão de ser divulgado no primeiro semestre de 2025, através do Nós por Nós – Observatório de Justiça Reprodutiva do Nordeste.

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